segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Billy

Chorei muito, muito.... Não de tristeza, mas de encantamento ao ver a manifestação da pura arte.
Onde: "Billy Elliot", filme de Stephen Daldry, França/Inglaterra, 2000.
Billy é órfão de mãe, cuida da avó com mal de alzhmeir. Filho de um minerador de uma cidade interiorana da Inglaterra, Billy tem paixão pela dança e passa a frequentar aulas de balé escondido do pai.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Diálogos entre Capra e da Vinci

A grama é nobre em si própria sem a linguagem ou letras humanas
Leonardo da Vinci


Se Leonardo da Vinci foi imortalizado como um dos maiores gênios da pintura de todos os tempos com a produção de obras como Gioconda e a Santa Ceia, suas teorias científicas, no entanto, foram ocultadas por aproximadamente 500 anos. Se Galileu tivesse tomado conhecimento de toda a produção científica de Da Vinci, certamente o curso da ciência no ocidente teria tomado outro rumo, diz Fritjof Capra* em palestra proferida em São Paulo, no lançamento do seu mais recente livro “A ciência de Leonardo da Vinci”.
Segundo Capra, da Vinci não tinha interesse em fenômenos sociais e políticos, estava sim interessado nas relações entre os seres vivos, na dinâmica da natureza onde considerava que nada era supérfluo ou em demasia. Era um romântico vegetariano que não queria maltratar os animais e tinha uma perspectiva ecológica, uma preocupação com o ambiente e sua cidade. A produção artística estava ligada amorosamente ao desenvolvimento da sua teoria, isto é, através da sua habilidade visual – que chamou de janela da alma - estudou, pintou e desenhou meticulosamente as formas orgânicas relacionando-as à sua teoria que contém semelhanças com o novo paradigma científico dos sistemas auto-organizadores deste século. Da Vinci recebeu treinamento por volta de 1460, quando o pensamento da época estava ainda emaranhado pelo obscurantismo da Idade Média, quando os experimentos e ciência eram mal vistos, ocultados e desencorajados.
Estes alguns dos muitos detalhes que Fritjof Capra faz ressurgir em seu livro. A sua pesquisa demorou cinco anos, e precisou de mais dois anos para escrever sobre Leonardo, reconhecendo que a ciência do renascentista é um corpo sólido, contém uma visão global analógica à teoria sistêmica, além de ser inspiradora: Leonardo perseguia a ciência não para dominar a natureza, mas aprender com ela. Para escrever o livro, Capra, que fala italiano, recuperou e traduziu cerca de 8 mil páginas escritas e dispersas em cadernos de anotações, bibliotecas e museus espalhados pelo mundo deixados por da Vinci, que era canhoto e escrevia da direita para a esquerda.
Uma pergunta da platéia sem resposta, no final da palestra de Capra: Não estaria faltando à arte contemporânea talento, amor e ciência, o mesmo que Leonardo conseguia unir em seus trabalhos artísticos?



* Autor de “O Tao da Física”, o físico Fritjof Capra proferiu palestra na livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo, no dia 12 de novembro.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A busca da quietude


"Quando a mente é perturbada, produz-se a multiplicidade das coisas; quando a mente é aquietada, a multiplicidade das coisas desaparece.” Ashvaghosha














Ao centro, a yogue e profa. Beatriz no espaço de Prema Yoga,
rua Plínio de Moraes, 21, Perdizes.

“Temos físicos sondando a matéria com a ajuda de sofisticados instrumentos, e místicos sondando a consciência com a ajuda de sofisticadas técnicas de meditação.” “Ambos alcançam níveis não-ordinários de percepção, nos quais os padrões e princípios de organização que observam parecem muito semelhantes.” Fritjof Capra



“Se falarmos da experiência de espaço na meditação, estaremos lidando com uma dimensão inteiramente diferente. (...) Nessa experiência de espaço, a seqüência temporal é convertida numa coexistência simultânea, a existência lado a lado das coisas (...); isso, uma vez mais, não permanece estático, mas torna-se um continuum vivo no qual o espaço e o tempo acham-se integrados.” Lama Govinda


“A abordagem sistêmica, da teoria dos sistemas vivos e auto-organizadores, leva a uma concepção unificada de vida, mente, matéria e evolução. A abordagem sistêmica confirma os paralelos entre a física e o misticismo”. Firjof Capra

sábado, 8 de novembro de 2008

As neuroimagens confirmam

. O cérebro não distingue o imaginário do real. As reações cerebrais são idênticas.

. A teoria subliminar :
- a retina pode não ver determinados eventos, mas o cérebro capta e reage a eles.
- sons inaudíveis, da mesma forma, são captados pelo cérebro.

É o que nos informa o jovem neurocientista mineiro Edson Amaro Jr., palestrante do 69º Fórum do Comitê Paulista para a década de Cultura da Paz, em parceria com a Unesco, no Masp, dia 4 de novembro de 2008; também entrevistado por Marília Gabriela no GNT, indo ao ar no mesmo dia.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A Comunicação como Acontecimento

Com a preocupação de diluir estruturas, desconstruir revelações engessadas no campo acadêmico da Comunicação, o professor Ciro Marcondes Filho, filósofo da comunicação na ECA, USP, introduziu o seu novo conceito sobre Comunicação e o seu não método, o Metáporos, em palestra proferida no seminário de Interprogramas na PUC em São Paulo*.
Segundo Ciro Marcondes há um impasse ontológico na área de Comunicação porque há quase 40 anos trabalhando como professor e pesquisador nessa área, considera que nunca se pesquisou sobre a própria Comunicação. Esta disciplina tem sido um simples rótulo, um cruzamento com outras áreas como sociologia, antropologia, política e economia. Segundo ele, para consolidar um saber é necessário colocar inicialmente o que vem a ser Comunicação, qual a sua primeira natureza com um método entrelaçado ao objeto de estudo.
Desde a década de 70 as Faculdades de Comunicação Social no Brasil têm crescido num ritmo vertiginoso. Em 99 eram 263 faculdades oferecendo 365 cursos de graduação, entre eles publicidade, jornalismo, relações públicas, rádio e tv, cinema, produção editorial e comunicação social (2). A proliferação da mídia linear e em rede acabou por se consolidar e está incorporada no hábito dos cidadãos, quer seja no trabalho, na cultura, no entretenimento. A procura pelos cursos de comunicação, portanto, além de ser um atrativo aos jovens para se inserirem nesse texto tecnocultural mágico e mesmo transformador antropológico da sociedade contemporânea, é também uma questão de demanda.
As interfaces com outras disciplinas, da mesma forma, ganharam contornos expressivos na pesquisa de campo e sua conseqüente produção acadêmica. Assim, a transdisciplinaridade ganha força para o seu aperfeiçoamento também na reprodução e na sua aplicação (2), não apenas para o campo da comunicação, mas transitando entre as diversificadas ciências. Mas não só, o verdadeiro pesquisador, o investigativo e farejador que não encontra respostas suficientes para seu objeto de pesquisa dentro das ciências humanas e sociais, percorre outras ciências como a matemática, a física moderna e as neurociências. Como tantas outras teorias, a de Gaia que postula a Terra como viva, surgiu dos trabalhos do químico especializado na química atmosférica James Lovelock com a pesquisadora científica em microbiologia Lynn Margulis (3). Não se pode esquecer ainda que a literatura catalogada nas livrarias como esotérica, tem sido cada vez mais consultada por pesquisadores que ousam ao não científico.
E é da conjunção, da união da diversidade do conhecimento que Marcondes Filho propõe a sua nova teoria da Comunicação, para nortear estudos de caso e investigação, que dê curso “um sonho de ciência mutante, que se transforma a cada momento e que, nem por isso, perde seu rigor e sua capacidade de construir saberes (4) no prelo.

A Teoria da Comunicação e o Metáporo

O que é comunicação? Segundo Marcondes, é pueril afirmar que comunicação caminha linearmente de um ponto a outro, entre o receptor e o emissor, por um determinado canal, por onde passa uma determinada mensagem. A comunicabilidade, ao contrário, seria etérea, estaria num continuum amorfo atmosférico, nômade, sem definição de espaço, um incorpóreo, um fluxo, uma nebulosa, sem previsão de chegada e sem tempo definido. Segundo o autor há três níveis de comunicação: o primeiro seria uma simples sinalização, no segundo nível entraríamos na informação, e apenas no terceiro patamar teríamos a comunicação, que não apenas informa, mas transforma. A teoria da informação visa o controle do outro, informar-se para se abastecer, para manter o que você já tem consolidado, ao passo que no terceiro nível encontramos o acontecimento comunicacional, sem objeto delimitado, um objeto que é novo, ágil, cobrando do procedimento investigativo uma atitude igualmente dinâmica, que seja um objeto transitório, assentado no movimento. Comunicação é, portanto, "um acontecimento que produz o novo. A emergência do nunca-antes-dado, daquilo que marca o inusitado, o inesperado, o incomodante, o perturbador, o irritante” (4). É um acontecimento que me transforma e que incorporo, diz o autor, e é precisamente nessa transformação que o sentido surge extrapolando o campo da língua, possibilitando o acesso ao que não se possui. O investigador, por outro lado, precisa poder se misturar nesse acontecimento, onde o eu se desfaz, liquefaz nos acontecimentos e nos fatos. O procedimento de estudo e investigação deve ter um percurso igualmente nômade, que vai atrás dos fenômenos como produtos de um jogo de acasos, andar sem metas, utilizando, como ele diz, as metáforas de “Alice no país das maravilhas”, um caminhar errático, não traçado. Esse o não método, que varre o caminho viciado, a repetição, e na sua errância vai abrindo suas passagens em busca de algo, como Alice segue atrás do coelho branco, exigindo que o investigador esteja imerso e vivencie o acontecimento, e onde o estranhamento persista no seu estranhamento (4).
Não existe modelo de verdade e as normas científicas existem para serem burladas, diz Marcondes. E a questão comunicação, o saber comunicacional sob esse novo paradigma pode continuar a incomodar.

P,S, As intervenções da platéia sobre a teoria e o metáporos foram modestas. Não se sabe sobre os bastidores.
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*V Interprogramas (proposta do pesquisador L. Martino da UNB), sediado na PUC-SP, no dia 28 de outubro de 2008.
Veja mais: http://mclpublica.blogspot.com/2008/10/interprogramas.html

(1) CANEVACCI, Massimo. “Polifonia dos Silêncios”. In: Matrizes 2 – Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da USP. Abril de 2008.
(2) LOPES, Maria Immacolata Vassallo de. “Sobre o Estatuto disciplinar do campo da Comunicação”. Epistemologia da Comunicação. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2003.
(3) CAPRA, Fritjof. A teia da vida. Cultrix, São Paulo, 2006.
(4) MARCONDES FILHO, Ciro. A Razão Durante. São Paulo, 2009, no prelo.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Modelo podre

A farra do consumo :
... se o mundo todo consumisse o que os Estados Unidos consomem, necessitaríamos de mais 4 1/2 planetas Terra...
... se os Estados Unidos diminuírem o consumo é inevitável uma recessão mundial...

Paradigma bichado.

* a constatação e o paradoxo no programa do Heródoto na CBN do dia 29/10/2008.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Dialogismo

Querida Carolaine:

A fórmula infalível para combater a celulite é entrar na menopausa.

Intertextualidade

Combatendo os males na terra da abundância:

Na ansiedade tome 4 comprimidos de Ansiodoron (homeopático)
Para stress e depressão outros 4 comprimidos de Stressiodoron (homeopático)
No combate à TPM, 2 comprimidos ao dia de Prímores (erva medicinal), por pelo menos 3 meses.

Indivíduos abandonados à própria sorte

Resumão

LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade Paradoxal. Ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.


Segundo Lipovetsky estamos no terceiro ato das economias de consumo. O primeiro ciclo considerado como o consumo de massa, começa por volta de 1880 e termina com a segunda guerra mundial, com o surgimento das grandes marcas, dos produtos acondicionados e o início da publicidade. Em 1950 surge a segunda fase consumista, constituindo-se fundamentalmente pela grande ruptura cultural, desligitimando os valores vitorianos e ideais de abnegação e sacrifícios. E o último, nosso contemporâneo, iniciado na década de 70 denominado como a fase do individualismo, do hedonismo e do hiperconsumo, onde o homem se serve da abundância das coisas para satisfazer no consumo das coisas seus desejos imediatos, um gozo instantâneo privado. A civilização do desejo. Liberado, o indivíduo é legislador de sua própria vida, permitindo-se sem culpas e remorsos ter o gosto exacerbado pelas novidades. Não há resistência para o homo consumatur, o ethos mercantilizado se consumou. Não há retorno nem catastrofismo para a sociedade do hiperconsumo, segundo o autor. Mas a despeito dessa exibição de abundância, o homo felix é uma ilusão. A felicidade escapa ao controle, ela é imprevisível e enigmática e tem acesso restrito, o seu acesso está além do império do consumo.
Diferentemente das fases anteriores, neste ciclo almeja-se objetos para viver bem, sentir sinestesias, viver experiências muito mais do que exibi-las. Assim as mercadorias apresentam-se como signos experienciais, como um consumo para busca de felicidades privadas, signos que não exteriorizam riqueza ou sucesso, mas que prometem criar ambiências personalizadas, criativas e de estilo. O gosto pela comida mestiçada, o casulo do lar com a identidade do seu dono, a mania e o fetiche pelas marcas; e a espiritualidade não escapa ao neoconsumidor, também é comprada e vendida. A distinção de classes tem seu fim nesse ciclo, diz o autor.
Segundo recentes pesquisas, os franceses riem pouco, diz Lipovetsky, não mais que cinco minutos por dia. O riso civiliza-se. O riso fácil é contido, a gargalhada é vulgar como também o é Dionísio, deus do vinho e da licenciosidade. Não há tempo para ser Nêmesis, a deusa da inveja, porque é a era de um Narciso especial, vigilante, obcecado pela imagem, pelo peso e pelo consumo de produtos saudáveis. No trabalho, ansioso, almeja sempre ser reconhecido. E os franceses consideram-se felizes. Seria duro demais tornar público o seu fracasso.
São 370 páginas (ups!!) descrevendo e argumentando o ethos da contemporaneidade mercadológica, de um lado mazelas, violência e solidão, de outro a relação do conforto, bem estar, a sedução das grandes vitrines, dos lazeres, das viagens. Um ethos egóico, como diríamos nós.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Um acontecimento*


Amplas janelas, vistas para o fundo do pátio com algumas árvores, os prédios, as casas. O ambiente interno bastava. No chão um carpete de cor neutra, em cima, cerca de 20 esteiras de borracha com grandes lenços ou toalhas coloridas cobrindo cada uma delas, e as almofadas individuais. Três degraus acima, mais duas esteiras, ao centro um balcão de alvenaria com algumas estátuas de bronze, um retrato emoldurado, dois vasos de flores, algumas velas; no pilar ao lado, caixinhas de lenço, as caixas de som, uma pilha de cds , os sticks perfumados.
Pés descalços, roupas confortáveis, uma vela acesa, a vibração no corpo da emissão dos sons, primeiro o som primordial, o som da criação do Universo, da pulsação do próprio cosmos, do mantra om, seguido de outros sons igualmente construídos com palavras do poder, do mantra que protege que esvazia pensamentos, ou simplesmente vê esses pensamentos passarem. Como vem, vão, pensamentos despertencentes.
Depois um cd escolhido, uma música de sons da natureza, os pranayamas e em seguida os asanas. E foi ali entre os triconasanas com os braços estendidos ao lado do corpo, com as palmas das mãos erguidas, distante uns 30 centímetros de outro corpo sem nome, sem rosto, o surgimento de um acontecimento, um fluxo movente de troca de energias, entre duas massas distantes e distintas, um incorpóreo, invisível, um roçar de spins saltitantes. Dois corpos aquecidos conectados em eventos especiais.

* Título inspirado na obra de Ciro Marcondes Filho: Princípio da razão durante. Por uma teoria do acontecimento em comunicação. São Paulo, Paulus, 2009, no prelo.
** pintura em acrílico, helena charro, 2007.



segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Temores e tremores culturais - Os gestos nas olimpíadas de Pequim

As oposições de vitória e derrota expressas nos gestos dos atletas nas olimpíadas já foram estudas por cientistas, conforme artigo do biólogo Fernando Reinach,* e os resultados evidenciam que as posturas corporais desses dois contrários são procedimentos inatos, biológicos, não aprendidos pela cultura. Nos gestos dos vitoriosos os movimentos se repetem: os braços são levantados, os peitos se estufam com a cabeça para trás, e os punhos se fecham. Nas derrotas, os gestos são de encolhimento do corpo, olhar para baixo, os braços se largam e os ombros se encurvam. Segundo o mesmo artigo, são gestos estereotipados encontrados também em macacos, mesmo naqueles criados sem contato com a mesma espécie, sendo portanto, reações provenientes de herança genética.
Mas e o que dizer sobre temores e tremores na finalização da performance de cada atleta brasileiro nas olimpíadas? É inegável a competência dos atletas, a maioria disputando em condições físicas semelhantes - excetuando-se raridades como o nadador norte-americano Michael Phelps e Usain Bolt da Jamaica - portanto as medalhas não justificam apenas graus de competência, mas de algo que faltou à maioria de nossos atletas. Para citar apenas um exemplo, não podemos esquecer o brasileiro Diego Hypólito, que treinou rigorosamente durante quatro anos, era o grande favorito na ginástica artística e, no entanto, no momento da transformação, a performance não foi alcançada, a inglória derrota de cair no momento decisivo.
A falta de preparo psicológico é uma questão individual ou cultural? Temores e tremores fazem parte da herança genética do sapiens, são fruto das emoções, mas a sua constância e repetição observados nas olimpíadas sugerem uma subcultura do medo do sucesso projetada na equipe de atletas como um traço peculiar negativo e característico do país, como um preconceito de si mesmo, de suas raízes, de pertencer a um país pouco levado a sério. Ou estariam também nossas crianças crescendo sem vínculo e afeto familiares, alicerces para a formação do guerreiro de Castaneda, do amadurecimento, da auto-estima e controle das emoções no enfrentamento de conflitos e decisões?
Do sucesso dos chineses nas olimpíadas não há que se retirar exemplos, transformaram-se em signos ideológicos do estado, depois de alguns anos em cativeiro.

*Reinach, Fernando. “As olimpíadas revelam nosso lado animal”. In: Jornal “O Estado de São Paulo”, 21 de agosto de 2008. Mais informações: The spontaneous expression of pride and shame: Evidence from biological innate nonverbal displays. Proceedings of the Nat. Academy os Sciences, v. 105, p.33,2008

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Gestos da cosmética

O gesto de barbear é o gesto do racionalismo formalista, um gesto clássico, não romântico e anti-revolucionário. Naturalmente, não se pode dizer que quem se barbeia é um fascista; porém cabe dizer que quem é fascista jamais terá uma barba cerrada. Vilém Flusser


Com ritmos cadenciados girando em volta de si mesma e um outro maior, o elíptico, reverenciando a sua existência, a consciência terra produz movimentos para além dos seus gestos biofísicos... Como que incorporando a cultura dos gestos humanos de domínio e exploração, o planeta, transformado em quarto de despejo, também já emite os seus movimentos adquiridos por essa cultura. São movimentos imprevisíveis, alguns furiosos das quedas das geleiras, outros silenciosos e pesados aquecendo a atmosfera.
Mas apenas constatar e observar esse ciclo passa a ser um gesto ecológico, pós-histórico, como a crise que se afigura da existência da própria história da devastação, diz Flusser (1994). Ao analisar as semelhanças dos gestos do jardineiro, do barbeiro e do contemplativo ecologista1, considera que o jardineiro apara o jardim para transformá-lo numa geométrica beleza artificial, como o ecologista, o vigilante da natureza quer replantar árvores nas regiões desmatadas, sem no entanto reverter o ciclo da destruição da biodiversidade, porque a história do homem se confunde com o gesto da posse e domínio da terra, e isto significa que é chegado o momento (talvez tardio) do homem modificar a sua própria história; e o barbeiro ao fazer a barba elimina vestígios dos pêlos, usa os mesmos utensílios miniaturizados do jardineiro, um gesto que não tem o propósito nem de criar cultura, nem de salvar a natureza para o homem, senão acentuar e ampliar as fronteiras entre o homem e o mundo. Segundo Flusser, seriam gestos artificiais, cosméticos e superficiais porque esses gestos são externos à natureza.
Sob esse ponto de vista, observando-se mais detidamente a cidade de Paris, encontramos ali os gestos do zeloso e anônimo jardineiro, que minuciosamente poda, formata e conserva toda a vegetação existente, adquirindo uma paisagem singular. Com sua construção arquitetônica com imponentes monumentos, que não nos fazem esquecer os séculos de cultura, e os seus geométricos jardins, sem os resíduos naturais de ervas e matos, o cenário da cidade serve aos viajantes. Paris assemelha-se a um mausoléu recém limpo, a um cemitério com suas quadras, túmulos e árvores, todos produzindo um distanciamento entre o mundo e o homem? Não é ali, um dos centros da cultura ocidental, onde podemos pressentir homens e angústia da existência pairando naquela atmosfera de luzes artificiais? E no seu subterrâneo, no maior conglomerado de trilhos, trens, lixo, odor de fezes, publicidade, resta eficiência nos horários e velocidade para alcançar e cruzar as quadras desse gigante cemitério. E nos vagões, a sensação de que os gestos da apatia e da descrença quase não se movimentam em oposição aos do entusiasmo do viajante. Para diminuir a extensão dos desencontros, o parisiense se apinha nos cafés.

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1 Note-se que em 1991, data da primeira edição de seu livro em alemão “Gesten. Verernuch einer Phänomenologie”, Vilém Flusser observa os gestos do então moderno ecologista, associando-o ao passivo vigilante da natureza destinado a produzir frases de efeito.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Dois tempos de Edgar Morin em São Paulo

O destino como causa maior

Da aventura do homem que começou há milhões de anos até a nossa era planetária ambivalente e polivante há razões de sobra para des-esperar e esperar; esperar o improvável, a incertitude, é a conclusão de Edgar Morin, fechando o ciclo do Seminário “Universo do Conhecimento” – A humanidade no séc. XXI, promovida pela Universidade São Marcos, em parceria com o SESC Pinheiros, em dezembro de 2007.
Por que a incerteza com relação ao futuro da humanidade?
Fazendo uma retrospectiva, Morin resume a existência humana em três eras planetárias. A primeira, lembrando que o homem não nasceu de uma só vez, do erectus ao homo sapiens, a sociedade era pouco numerosa, sem hierarquias, sem aldeias, sem cultura. A segunda através da colonização e a comunicação entre os diferentes pontos do globo, com uma Europa dominando longa e duramente outros povos, mas também um dos primeiros núcleos de idéias humanistas. E a terceira era planetária iniciada em 1989, 1990, denominada de mercado mundial, a etapa da globalização, com desenvolvimento inédito das comunicações e o encontro das mestiçagens, das culturas, sob o predomínio de padrões saídos da civilização européia se espalhando pelo mundo.
O paradoxo maior desta era planetária estaria em não respeitar as resistências de civilizações antigas e religiões profundamente arraigadas, como no caso do Irã, que mantém as suas bases culturais e religiosas e ao mesmo tempo absorve toda a tecnologia, inclusive armas de destruição. São antagonismos, segundo Morin, que provocam constantes ameaças entre estados e religiões, uma era única e múltipla, unificada e fragmentada, com economia de mercado sem controle, desregulamentado.
Outro erro estaria na idéia de um segundo rosto do humanismo desde Descartes, de que cabia ao homem conquistar a natureza com o maior rigor possível, e assim no transcorrer do século passado a biosfera foi se sufocando com a exploração impiedosa. Muitas outras são as ameaças lembradas por Morin, todas elas apresentando fenômenos inversos, entre o positivo e o negativo, como a lógica das máquinas, o prolongamento da vida humana, o controle dos cérebros tão rico de promessas e outras ameaças. São antagonismos criando um universo em estado de caos, de crise planetária, com gestação de modas e formas mutantes.
Por isso o futuro é de incertezas porque pequenos movimentos, às vezes aleatórios - como explica a teoria do caos - podem ganhar grandes dimensões e assim aguardar o improvável, diz Morin. Ele ilustra a idéia com o exemplo do nazismo em 44, que parecia se tornar vitorioso. No entanto, bastou a entrada dos americanos na guerra para o improvável se transformar em um acontecimento que reverteu uma continuidade antes prevista.
Um dos princípios da esperança na humanidade, segundo o pensador, continuaria nas mãos dos jovens. Se os jovens hoje acham que estão sem causa e que não há mais o que inventar, Morin acredita que a causa maior é o seu próprio destino.

Compreender o outro em Morin

Pensando na constância da incompreensão do outro, Edgar Morin, ao final da palestra, na abertura dos debates, enfatiza e fortalece a idéia da criação de uma cultura psíquica para a criança com a implantação de uma nova disciplina nos currículos escolares com o objetivo de minimizar o exacerbado individualismo ocidental, através da aprendizagem sistemática para um convívio de entendimento desde a infância.
A relação com o outro é realmente conflituosa, cheia de desentendimentos e ruídos. Compreender é algo que o ego desconhece quando se trata de demonstrar com quem está a razão. Podemos até compreender uma terceira pessoa, desde que o assunto não nos diga respeito, mas quando estamos envolvidos dificilmente cederemos porque abrir mão de certezas subjetivas seria uma forma de deixar transparecer fraquezas e dúvidas, e o ego é orgulho, é egoísmo, uma capa protetora contra feridas e submissões.
A partir dessas relações de conflito onde a incompreensão cresce, diz o pensador, existe esse mesmo círculo vicioso se estendendo para além da relação “eu tu”, ecoando da mesma forma numa sociedade, num país e nas relações entre os povos, onde as diferenças étnicas e religiosas criam climas de ódio, persistindo invasões e guerras entre fronteiras. De família judia, Morin torna-se esse outro incompreendido, inoportuno e ofensivo quando entende causa e sofrimento palestino.






Com o seu mais recente livro “Diário da China”, o vigoroso Edgar Morin de 86 anos, publicou em 1977 o primeiro livro da série “O Método” dando início à teoria da complexidade. É autor de dezenas de livros, entre outros sobre educação, como “Cabeça Bem-Feita” e “Os sete saberes necessários à educação do futuro”.